terça-feira, 9 de março de 2010

PIMENTA NOS OLHOS DOS OUTROS

"Que estúpido se não sabe que a infelicidade dos outros é dele e não se cura de fora.
Porque sofrer não é ter falta de tinta ou o caixote não ter aros de ferro!"
(Fernando Pessoa)
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A mais nova polêmica em Fortaleza é a pretensão do governo do Estado de construir um estaleiro na praia do Titanzinho, no bairro Serviluz. O que teria ensejado o projeto seria, inicialmente, a encomenda da Transpetro pela construção de oito navios.
Muito se comentou até agora nos meios de comunicação sobre as vantagens e desvantagens da instalação daquele equipamento. O primeiro óbice à intenção do governo é o fato de aquela área ter sido incluída no Plano Diretor como Zona Especial de Interesse Social, (ZEIS) nos moldes da Lei 11.977/2009. A verdade, entretanto, é que muitos esquecem de verificar o que pensam os moradores daquela área, esse sim o maior e melhor argumento contrário à sua efetivação.
Neste sentido, as organizações populares do Serviluz divulgaram uma carta aberta em que se colocam contra tal empreendimento, expondo motivos bastante coerentes para tanto (http://conselhospopulares.org.br/porque-somos-contra-a-instalacao-do-estaleiro-no-titanzinho/)
Em suma, o que dizem os moradores da região é que não se pode olvidar das intensas relações sociais, afetivas e culturais que eles mantém com o ambiente em que vivem, nem descartá-las em detrimento de uma rota visão desenvolvimentista, para a qual não interessa a construção de uma sociedade nova, solidária com os homens e com a natureza.
A ilusão do progresso e da geração de emprego para a comunidade cai por terra quando consideramos o exemplo do estaleiro de Pernambuco que teve que importar mão-de-obra do Japão e quando verificamos a degradação social que esse tipo de equipamento gera.
Porque não aproveitar o potencial paisagístico da região e qualificá-la para os moradores, dotando-a de melhor infraestrutura de serviços públicos, com a presença do Estado de outras formas e não apenas através do aparato policial? Porque não incentivar a vocação para os esportes dos jovens do bairro, principalmente para o surfe, gerando empregos através do turismo de eventos esportivos e de projetos sociais?
É tão óbvio o que se pode fazer, que não é preciso pensar muito para propor soluções alternativas ao tal estaleiro. Mas, como sempre, os arautos do progresso a todo custo, não sabem bem o significado dessa palavra. Esquecem que o progresso deve ser voltado para a melhoria de vida de todos os homens e mulheres e não apenas para o aumento das contas bancárias dos empreiteiros. Esquecem que a qualidade de vida das pessoas está intrinsecamente ligada ao local onde vivem, ao meio ambiente de que fazem parte. Degradado este, degradam-se as vidas dos que neles fazem sua morada. Há que se ressaltar, para não cometer injustiças, os que já se manifestaram publicamente contra essa afronta ao bom senso, como é o caso da prefeita Luizianne Lins e do vereador João Alfredo.
Por fim, devo dizer que noto um fato muito revalador quando leio as opiniões favoráveis a esta aberração: @s que defendem o projeto não moram próximo ao local. Ao contrário representam a classe média alta empolada, preconceituosa e reprodutora de tudo que sai na Veja e no Jornal Nacional. Duvido que ess@s gostariam de vê-lo instalado na frente de seus luxuosos apartamentos, privando-lhes da visão privilegiada de que desfrutam. Como diz o ditado, pimenta nos olhos dos outros é refresco.