quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

O juiz e o porteiro

Vivemos o recesso do Judiciário. Tudo parado. E já não estava? É engraçado como as coisas funcionam no Poder Judiciário cearense: vão empurrando com a barriga o ano todo até que chega o final de ano e com ele o famoso recesso. E todo mundo esquece tudo. "Depois do recesso a gente vê isso aí" - parece que ensinam isso a todos os serventuários. Ainda bem que nem todos assimilam essa lição. São honrosas - e cada vez mais raras - exceções.
É lógico que não falo mal do recesso em si. Ele é útil, sem dúvida. Até para nós, advogados, que podemos ter uma pequena amostra do que é esse negócio tão legal chamado férias e do qual não gozamos desde os tempos de faculdade.
O que critico (sei lá se critico; na verdade apenas esperneio inutilmente) é o mau uso que dele se faz. É como se o recesso fosse a panacéia para as mazelas dos fóruns. Alguns querem lhe atribuir o estranho poder de "purificação", como se após ele os processos passassem a tramitar céleres, oficiais de justiça não pedissem "o da gasolina" para cumprir o mandado, serventuários não achincalhassem os advogados no balcão ou não dessem a velha desculpa do "processo deslocado" ou "o juiz levou para casa" e as audiências fossem marcadas num prazo razoável.
Mas isso, infelizmente, não acontece. O serventuários continuarão despespeitando as prerrogativas dos advogados, os juízes continuarão a despachar (e até julgar, pasmem) através de algum serventuário, sem nem mesmo ver o processo (é verdade que pelo menos as assinaturas eu creio que são deles), oficiais de justiça continuarão a fazer corpo mole para cumprir os mandados e trabalhando dois ou três dias na semana. C'est la vie!
Dia desses eu conversava com um juiz sobre um processo. Eu representava um cidadão que é réu numa ação de alimentos proposta pela sua ex-companheira, saudável e econômicamente ativa, com quem não teve filhos e para a qual deixou o imóvel em que moravam. Ele teve 30% do seu salário (mínimo, diga-se en passant) bloqueado para pagar os alimentos que foram liminarmente deferidos quando do ajuizamento da ação. Em razão disso e por ter constituído nova família, contando com um filho recém nascido, meu cliente (na verdade, o porteiro de meu prédio), teve que se mudar para a casa da patroa de sua esposa, empregada doméstica.
Diante da urgência da situação fui ter com o magistrado para pedir-lhe que reconsiderasse a decisão, não obstante a interposição de agravo. Ele pegou o processo e disse: "Conheço esse processo Doutor. É...não tem como ser diferente! Não posso deixar a criança desamparada até o julgamento da ação. A minha decisão é irretratável."
Ao que retorqui: "Excelência, a única criança mencionada nos autos é o filho de meu cliente com sua nova companheira. A autora da ação é a ex-companheira dele, maior de idade!!!"
Ele titubeou, percebeu que não tinha, sequer, passado os olhos sobre os autos, limitando-se a apostar sua assinatura nas decisões digitadas por algum serventuário. Escapou-lhe um balbucio de surpresa (algo como "vixe"), alguns trejeitos denunciaram seu constrangimento, mas ele manteve-se altivo (?!): "É doutor, mas é isso mesmo. Vai ter que ficar para a análise do mérito do recurso. Depois do recesso a gente marca a audiência de instrução e vê como vai ficar". Pois é, é impressionante, mas é verdade!
Pois bem, meu cliente continua tendo seu desconto efetuado mas seu filho, com graça de Deus, vai bem, com a ajuda de uns e outros. Ontem desejei-lhe um feliz ano novo e ele sorriu como sempre, incólume na sua simplicidade espontânea. O Poder Judiciário, toda a sua máquina, foi incapaz de fazer justiça. E as suas mazelas, infelizmente, nem respingam nos seus membros, que continuam a se auto-conceder homenagens. Até a OAB entra nesse teatro do absurdo, homenageando alguns que pouco ou nada fazem para a concretização da Justiça.
Deixe estar. Quem sabe acontece um milagre e tudo realmente se renova em 2009? Creio em milagres, mas nesse caso seria preciso um mínimo de boa vontade dos homens. Nisso eu não creio, infelizmente.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Supermercado é condenado a indenizar cliente que escorregou em piso molhado

Em ação de reparação de danos morais patrocinada por este escritório, o Supermercado SuperFamília, foi condenado à reparar os danos morais de cliente que escorregou em piso molhado dentro de seu estabelecimento, no montante de R$ 4.000,00(quatro mil reais). O entendimento é do juiz do 10.º Juizado Especial Cível da comarca de Fortaleza, Dr. Mário Parente Teófilo Neto, nos autos do processo n.º 10.728/07. O acidente ocorreu quando o autor, que estava em fase final de reabilitação de cirurgia realizada no menisco do joelho direito, fazia compras no local. Ao se dirigir à seção de frutas e verduras para pegar alguns produtos escorregou no piso totalmente molhado e sem sinalização de advertência. A queda lesionou novamente o joelho operado e ocasionou a regressão no tratamento fisioterápico. Além da dor física, o constrangimento ocasionado pela queda diante dos demais clientes e a frustação da viagem de férias que realizaria, certamente influenciaram na decisão. Na sentença o magistrado ressaltou que "todo esse cenário reflete inquestionavelmente uma situação de alguém que passou por um vexame, uma sensação de impotência diante dos fatos; certamente uma situação de profunda dor física, caracterizando assim o dano moral que se refere ao infortúnio do espírito, o desconforto da alma, a tristeza, o sofrimentointerior porque alguém passa". E concluiu dizendo que "o promovido deve cercar-se das medidas de cautela (...) para evitar que sua clientela seja exposta a situações vexatórias e constrangedoras como essa a que foi submetido o demandante", pois, segundo o juiz, "esse é um ônus de quem explora a atividade comercial na venda de produtos em um supermercado, não se admitindo que o fato ocorrido com o autor seja solucionado sem que o demandado venha a ser chamado à devida responsabilidade". Da sentença cabe recurso às Turmas Recursais do Estado do Ceará.
A petição inicial está disponível em http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=798